sexta-feira, 22 de julho de 2011

VIVER PARA TRANSCENDER...

Viver para transcender

Viver para transcender
Há um momento na vida que já não vivemos mais apenas para satisfazer necessidades próprias. Há um  momento que passamos a viver para transcender.

No mês de abril de 2011, a professora Lúcia contou-me que estava com uma dificuldade para ajudar uma pessoa cega da Alemanha que estava em viagem para o Brasil. Ela estaria sozinha. Ela dominava parcialmente o inglês, mas desconhecia totalmente o Português. Ela pedira ajuda pela internet e, por intermédio de indicação na rede social, localizou a Lúcia, que estabeleceu com ela um tal vínculo que passou a ser essencial atendê-la  com todo cuidado. Mas o problema era outro. Ela teria seus compromissos em São Paulo, enquanto Lúcia reside em Curitiba.

Sabendo da necessidade, fiz um contato com uma colega que reside em São Paulo, tem filhos adolescentes e, quem sabe, pudesse prestar-lhe apoio. Mas as distâncias, os horários, os compromissos pessoais também a impossibilitavam de prestar o acompanhamento, o deslocamento do hotel para o evento até a Universidade de São Paulo – USP.

Lúcia teve de se deslocar de Curitiba para o hotel de São Paulo a fim de orientar os atendentes do hotel e travar o primeiro contato pessoal com a amiga cega da Alemanha. Depois vieram os contatos por meio de skype, webcam com os mensageiros do hotel. Seus filhos mobilizaram seus contatos com outros estudantes de São Paulo até que um desses colegas disponibilizou-se para acompanhá-la nas idas e vindas do hotel à Faculdade de Direito.

Mas, no início, ela escrevera: “Está difícil conseguir alguém para ajudar minha amiga. Estou quase arrependida.”
- Como é complexo arrebanhar pessoas para missões tão nobres!
- Por que não somos educados para lidarmos com as necessidadesdo outro?
- Por que somos celebrados apenas com as vitórias pessoais?
- Por que apenas o mérito é aplaudido?

Eis o que lhe escrevi antes de obter a solidariedade do jovem estudante.
Quanto ao contato da moça cega, o que lhe solicitou?
Como lhe poderá para auxiliar?
Por que arrepende-se de  algo que faz tão bem e que lhe realiza como ser que nasceu para servir?
Minha nobre, vibra com sua própria essência, pois que apenas os escolhidos a podem conhecer em tão curto tempo de vida.
Se somos buscados, nosso poder já ultrapassou a dimensão do controle sobre outras pessoas.
Nosso poder, nossa função já não é mais a da auto-satisfação. Nosso poder já alcançou a dimensão da transformação das vidas, das condições das pessoas.

 
Quando o poder do humano é usado para potencializar as forças do outro, não para diminuí-lo nem para controlá-lo, então, atingimos novo estágio de felicidade. “Sua felicidade não se limita ao que é percebido pelos  sentidos. Sua felicidade está nas raízes que alargam os passos do caminhante”……

Quando somos chamados não precisamos sufocar o outro com todas as nossas visões, nem com nossas preferências e maneiras. Mas podemos criar uma oportunidade, uma alternativa positiva.

Segundo Feuerstein, a qualidade da inteligência está em criar as condições, mesmo quando elas não são percebidas imediatamente.
O inteligente ama seu trabalho, ama suas gentes, assim como ama o desconhecido, o desafio……
O inteligente localiza os instrumentos, os apoios, as linguagens que aproximam as pessoas e as tornam mais eficazes.
O inteligente mostra-se eficaz, não porque realiza rapidamente sua tarefa nem porque livra-se do problema que lhe é demandado.
O inteligente é eficaz porque resolve o que necessita ser resolvido, um problema que lhe atinge ou que atinja a vida de outra pessoa.
Eis mais uma ação primordial do professor: ensinar o aluno a perceber e a buscar a Alternativa positiva.
O professor de matemática pode fazer constantes feedbacks aos seus alunos diante dos problemas: não há complexidade que resista a uma análise metódica dos dados.
Há sempre uma pista de saída.
Para encontrar a saída, não há que se lamentar por ainda ser aluno nem se julgar impotente diante do problema.
E ainda, não se pode julgar o problema de tão difícil solução  que seja melhor nem tentar  compreendê-lo.
Mas uma quarta condição é fundamental: desprender-se do prejulgamento. Nada é tão novo que não possa tornar-se familiar. Nada é tão complexo que não possa tornar-se simples.
E tudo, absolutamente tudo, pode ser realizado em conjunto.

Agora, retomo esse e-mail para concluir.
No tempo atual, não apenas as distâncias físicas encurtaram.
As pessoas aproximam-se não apenas para satisfação de suas próprias necessidades. Os problemas são partilhados e podem ser enfrentados em conjunto. As pessoas desejam ter experiências de conferir mais poder a quem apresente outras necessidades. Basta que lhes concedamos oportunidades e algumas condições para cada pessoa oferecer ao outro parte de seu potencial. O jovem ficou feliz com a oportunidade de conversar em inglês, conhecer um pouco sobre o modo como uma pessoa cega organiza-se e dirige sua vida.

Assim, como não há fronteira delimitada entre a língua oral e a língua escrita, também não há entre as línguas, entre as culturas, entre as pessoas com e sem deficiência.
Se a internet propiciou a aproximação, o contato entre as duas pessoas, o compromisso, a maturidade de não isolamento, o espírito de busca e de confiança nos outros seres humanos tornou um problema complexo em algo simples. Estabeleceu-se uma rede de apoio. O que era novo e desconhecido tornou-se familiar.
Uma necessidade que era individual passou a ser de muitas outras pessoas. Do mesmo modo, a satisfação
transcendeu a origem, a causa. Causa e conseqüência passaram a não mais se distinguir. Todos beneficiam-se quando se estabelece uma rede  de apoios humanos.
Nossas escolas precisam passar a educar para a transcendência. Todo conteúdo pode ganhar tal significado pessoal que possa constituir em ações a serem realizadas por alguma pessoa, em algum lugar.
A escola pode educar mais para os Processos, para as pequenas etapas. Os grandes resultados não são
completamente observáveis nem visíveis.
A cada dia, um sonho de realizar uma vida. A cada dia, não uma preparação para a vida, uma transcendência.

* Chuva, dá-me água para nutrir a sede nossas cabeças de menos obrigações e mais sensibilidade.
* Os autoritários lutam por suas crenças. Os seres humanos desenvolvidos lutam pelas necessidades das  pessoas.

Paulo Ross
21 07 2011

Fonte: http://profpauloross.wordpress.com/2011/07/21/viver-para-transcender/#comment-22 

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