domingo, 30 de março de 2014

CAPOEIRA E MÚSICA

CAPOEIRA E MÚSICA
SOUZA, Vera Lúcia Pereira de.


              Por conter informações do samba e do candomblé, ainda que contenha elementos africanos, há um consenso de que a capoeira é uma manifestação brasileira.
              É difícil datar o aparecimento da capoeira. As maiorias dos autores creem que ela tenha nascido ao longo do século XVIII entre populações aprisionadas na Bahia ou Rio de Janeiro. Enquanto uns creem na sua origem mais urbana no Rio de Janeiro, outros lhes atribuem uma origem mais rural, nas lavouras da Bahia[1].
              A musicalidade africana esta presente nas batidas das palmas e no toque do berimbau. Esse instrumento só passou a ser usado para acompanhar o capoeirista a partir do século XX. Registros mais antigos, do século XIX, descrevem o uso de outro instrumento chamado de URUCUNGO para acompanhar os capoeiristas[2].
              A capoeira sempre serviu para as pessoas africanas e seus descendentes organizarem-se em comunidade e combater à repressão na sociedade escravocrata.
              Em volta da capoeira os companheiros se aglomeravam, porém, com a capoeira também reagiam ao regime escravocrata. Seus praticantes eram chamados particularmente de capoeiras, mas, quando estavam agrupados, em grupos, eram chamados de malta, expressão própria para nomear bandidos e ladrões[3].
              Em meio à grande população de pessoas negras os capoeiras buscavam trazer alguns acessórios que os caracterizassem. Um desses marcos eram bonés, chapéus e fitas nas cores vermelha ou amarela. Os grupos de capoeiras optavam pelas cores de acordo com valores próprios da nação de pessoas africanas que pertenciam[4].
              Com o passar dos anos algumas pessoas brancas pobres e marginalizadas e algumas pessoas mestiças, também, passaram a praticar a capoeira, isso ainda no século XIX. Essa notoriedade fez com que durante o século XX a capoeira, nas suas modalidades Angola e Regional espalhasse por todo o território brasileiro[5].
              A capoeira na modalidade Angola é vista como modelo de pureza, ou seja, aquela que eterniza as tradições verdadeiramente africanas, ao passo que a capoeira Regional é analisada descaracterizada. Mestre Pastinha, pessoa negra baiana, nascido no fim do século XIX e falecido na década de 80, é considerado como o grande ícone do conservadorismo, visto como aquele que teria melhor conservado a legítima Capoeira Angola, a única genuinamente africana[6].
              A capoeira que se pratica majoritariamente é do tipo Angola muito idêntica aquela que era exercitada no período colonial. O canto, os instrumentos e os movimentos são componentes de igual importância[7].

BERIMBAU



              Berimbau é quase sinônimo de capoeira. É ele que origina o tipo do jogo de acordo com o compasso tocado. O som do berimbau vem da batida da baqueta de encontro ao arame, que é estirado em um pau envergado. Uma cabaça é utilizada para ampliar o som. Comumente é usado, também, um caxixe, recipiente de vime com sementes[8].
Não existe capoeira sem música. Os músicos são os primeiros componentes que se posicionam em uma roda de capoeira. São os músicos que direcionam os cantos que falam das experiências vividas na África e na América.
              Tem o cantor principal que é o puxador da música e é acompanhado pelo restante do grupo de capoeiristas. Antes de iniciar o canto tem o anúncio sob a forma de um grito que diz “Iê”[9].
              No começo os capoeiras permanecem agachados próximos dos instrumentos musicais, em concentração, para depois entrar na roda. Neste momento o canto principal entoa a primeira parte do canto denominado de “ladainha”[10].
“Iê”
Ô meu Deus o que é que eu faço
Para viver nesse mundo.
Se ando limpo sou malandro,
Se ando sujo, sou imundo.
Ô que mundo velho grande, ô iaiá
Ô que mundo enganador.
Se eu digo dessa maneira, ô iaiá
Foi mamãe que me ensinou.
Se não ligo sou covarde,
Se mato sou assassino
Se não falo sou calado, ô iaiá
Se falo sou falador[11]

              Com o termino da ladainha, os componentes que vão entrar na roda se colocam na frente do berimbau do cantador principal e se cumprimentam, enquanto os outros componentes que formam a roda também fazem um cumprimento. Esse momento do canto é a chula[12].
              A parte final é o corrido, em que os capoeiristas podem começar a jogar.

Se não como sou mesquinho, ô meu Deus
E se eu como sou guloso!
Camarado!
Iê, viva meu Deus
Iê, viva meu mestre!
Iê, viva todos os mestres
Iê, é mandingueiro
Iê, sabe jogar
Iê, a capoeira
Iê, faca de ponta
Iê, faca de furar[13]

ATABAQUE



              O atabaque[14] é um instrumento de percussão. É confeccionado em madeira cortada em ripas largas e presas umas às outras com arcos de ferro de diversos diâmetros. São colocadas travas que acoplam um pedaço de couro de boi, bem curtido e muito estendido. É o atabaque que baliza o compasso das batidas do jogo. Juntamente com o pandeiro é ele que segue o solo do berimbau.

PANDEIRO



              Pandeiros[15] podem ter peles de couro ou de plástico. Os pandeiros existem e, diversos tamanhos, sendo os de 10 a 12 polegadas os mais utilizados na capoeira. O pandeiro é segurado por uma das mãos, enquanto a ponta dos dedos, o polegar e a base da outra mão são utilizados para tocar.

CAXIXIS



              Caxixis[16] são cestos entrelaçados com pedras, conchas ou feijão dentro deles. São feitos artesanalmente e utilizados com chocalho pelo tocador de berimbau, que o segura juntamente com a baqueta.

AGOGÔ



              O agogô[17] é um instrumento composto por um pequeno arco e uma alça de metal com um cone metálico em cada uma das pontas. Esses cones podem ser de vários tamanhos e, consequentemente, produzem vários sons.


RECO-RECO






              O reco-reco[18] é um instrumento de percussão produzido a partir de caixas ou tubos de metal ou de madeira. Para tocar, desliza-se uma baqueta de metal ou de madeira nas molas ou sulcos das caixas e tubos.
             

CONCLUSÃO

              A prática da capoeira passou um extenso tempo sendo considerada como crime no Brasil. Os capoeiristas podiam pegar de dois meses a três anos de prisão. No ano de 1937, no período do Estado Novo passou a capoeira passou a ser aceita[19].
              Da capoeira surgiu a dança do Frevo[20]. Os capoeiristas abriam os desfiles das bandas de frevo gingando e aplicando rasteiras que não eram comuns aos grandes centros urbanos. Era comum, que políticos contratassem os capoeiristas para fazer “quebra-quebras” nos dias das eleições. Assim a policia, se ocupava de conter o “quebra-quebra”, deste modo, aumentavam as fraudes eleitorais.
              A Capoeira resiste, a pessoa negra defendeu sua luta, e ao transformá-la, fizeram-na brasileira. Devemos as pessoas negras essa capacidade de resistência e luta para continuar a existir em condições duras e difíceis.
              Hoje em dia, a Capoeira vem adquirindo maior número de simpatizantes em todas as raças e categorias sociais no Brasil e em outros países. E é nesses outros países que a Capoeira ganha a sua carecida importância mundial, por ser uma arte em compassos e movimentos, que demonstra toda a criatividade de um povo oprimido, sofrido e desprezado.
              A despeito de todo esse desenvolvimento, a sociedade ainda pouco conhece a respeito dos verdadeiros valores e as contribuições que podem advir da informação e prática da Capoeira.


SUGESTÃO DE FILME



              BESOURO: Da Capoeira Nasce um Herói. Direção João Daniel Tikhomiroff, 2.009. Filme inspirado em fato reais, no qual um menino negro que, ao se identificar com o inseto (besouro) que desafia as leis da Física, desafia ele mesmo as leis do preconceito e da opressão. Tendo como cenário o Recôncavo Baiano, a história se passa nos anos de 1.920.




[4] Idem.
[5] Idem.
[6] Idem.
[8] Idem.
[10] Idem.
[15] Idem.
[16] Idem.
[17] Idem.

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