domingo, 30 de março de 2014

DIVERSIDADE DE GÊNERO – MULHERES

DIVERSIDADE DE GÊNERO – MULHERES
SOUZA, Vera Lúcia Pereira de.


              Cada homem vale pelo espaço onde está: o seu valor como elaborador, consumidor, cidadão, esta sujeito a sua localização no território. Seu valor vai modificando, incessantemente, para melhor ou para pior, em função das contestações de acessibilidade (período, assiduidade, preço), independentes de sua própria condição. Indivíduos, com as mesmas virtualidades, a mesma constituição, até mesmo o mesmo ordenado apresentam valores díspares segundo o ambiente em que vivem: as oportunidades não são as mesmas. Por isso, a possibilidade de ser mais ou menos cidadão esta sujeito, em ampla proporção, do ponto do território onde se está. Enquanto um ambiente vem a ser condição de sua pobreza, outro ambiente poderia, no mesmo período histórico, promover o ingresso àqueles bem e serviços que lhe são teoricamente necessitados, mas que, de fato, lhe carecem. (SANTOS, 1987).
              A dignidade da pessoa humana é o valor fundamental da proteção dos direitos humanos, permitindo, no campo global, sua proteção por organizações internacionais, que podem ser liberadas a atuar até em aversão ao exercício do poder soberano de determinado Estado.
              Após de 1945[1], o indivíduo em uma situação estrema pode até perder o direito ao exercício de sua própria nacionalidade, mas não perderá a segurança da assistência internacional.
              Dessa forma, na grandeza global, a dignidade da pessoa humana demanda, muitas vezes, a atuação de uma organização universal para ser eficientemente resguardada. No domínio local, a ação é outra, pois o intercâmbio acontece no dia-a-dia, face a face. É imprescindível o eficaz respeito à dignidade de cada indivíduo humano nas suas mais distintas singularidades. A importância do outro, do desigual, é o embasamento de uma relação de hospitalidade e ao mesmo tempo um fator fundamental para criação da identidade que, para ser edificada, precisa do diálogo com outro desigual de mim próprio e que, antes de tudo, reconheça-me enquanto mediador. (TAYLOR, 1992).
              O aprendizado de respeito aos direitos humanos no plano local não se dá na consideração daquele que nos é achegado, igual, conhecido e, assim sendo, a priori considerado, mas sim perante do outro, do desigual de nós, do diverso, uma vez que:

(...) aceitar a diversidade cultural não é um ato de tolerância para com o outro, distinto de mim ou da minha comunidade, mas o reconhecimento desse outro (pessoal e comunitário) como realidade plena, contraditória, como portador de saber, de conhecimentos e práticas por meio das quais ele é e tenta ser plenamente. (COLL, 2006, p. 98).


              Nos processos de mediação, os direitos humanos e precisões fundamentais desempenham uma função constitucional: oferecer diretrizes para uma boa resolução. Explana Galtung (2006, p.111):

Aqui está uma regra básica: se a realização de um objetivo for de encontro às necessidades humanas básicas – direitos básicos – então ela é legítima. Necessidades básicas, ou seja, sobreviver com bem-estar físico, significando que as necessidades biológicas sejam razoavelmente satisfeitas, vivendo a vida em liberdade, com identidade e sentido. Os direitos humanos refletem isso, não a perfeição, mas com uma boa aproximação. Por isso usa as necessidades básicas como guia.


              Essa visão do livre-arbítrio e do desenvolvimento como duas atuações integrantes e a precisão de se abolirem os impedimentos ao exercício da liberdade relacionam-se abertamente com a significação de Galtung (2006, p.334) sobre a violência:

A violência é aqui definida como a causa da diferença entre o potencial e o atual, entre o que poderia ter sido e o que é. A violência é o que aumenta a distância entre o potencial e o atual e o que impede a diminuição dessa distância.


              Nesse ponto de vista, violência é todo ato que impede ou atrapalha o desenvolvimento (a redução entre a potencialidade e o atual). Nessa definição, a não-violência deve ser avaliada condição fundamental e imprescindível para o exercício do direito ao desenvolvimento. Tais direitos carecem estar resguardados, com uma verdadeira “aura” de não-violência, já que eles são o embasamento de tudo aquilo que o ser humano pode vir a ser.
              É muito importante o fortalecimento de atuações do MEC em relação ao Pacto Nacional de Enfrentamento da Violência contra as Mulheres[2].


Agressões, assédio sexual, espancamentos, estrupos, assassinatos, violência simbólica, são algumas das formas de violência contra mulheres, presentes na vida cotidiana, de forma explícita ou, muitas vezes, silenciadas. Afora a antiga e persistente mercantilização do corpo (a prostituição), a que muitas mulheres se submetem para sobreviver, agora atualizada pelo turismo sexual. Estas violações são de conhecimento da população e a preocupam (...). (SILVEIRA, 2008, p. 47).


              É de suma importância investir na educação de homens e mulheres, tendo como finalidade um regime de equidade de gênero. Só que a transformação não virá somente por conta de projetos de educação dos homens. É imprescindível modificar elementos essenciais de nossa estrutura social e, inclusive, na estrutura econômica. E os processos educacionais devem compreender igualmente as mulheres, que na maior parte dos casos convivem de modo a admitir que os homens tenham estas condutas violentas, mesmo quando deles divergem.
              A escola não tem como “deliberar” sozinha esta demanda, visto que as pedagogias de construção da masculinidade estão presentes em publicidades da mídia, em sistemas de recrutamento de recursos humanos, nos discursos a respeito da segurança e família, em muitos discursos religiosos que afiançam para o homem a posição de comando sobre a mulher e explicam isso de maneira “divinal”. Porém a escola pode ser um espaço onde os meninos e as meninas passem por uma experiência de estudo e discussão destes assuntos, e de vivência num argumento aonde a equidade de gênero é a regra. Para isso, professores e professoras têm que compreender que meninas podem ser ótimas em Matemática e em Educação Física, e os meninos pode aprender a fazer poesias na aula de Língua Portuguesa e a tirarem excelentes notas em Educação Artística. Não vai ser simples, nem para professores, nem para professoras, nem para alunos, nem para alunas. Mas valerá a pena como edificação de um vindouro mais equitativo. Contudo, batalhar por isso é dar mesmo um salto para o amanhã digno para todos e todas.
              Nesse sentido, a escola é tanto um estabelecimento no qual frequentam, de forma nem sempre harmoniosa, díspares grupos e identidades sociais, quanto é uma instância em que se questionam significados que produzem, atuais e transformam algumas dessas identidades. Por isso a escola é um ambiente social complexo e plural na qual interatuam fatores internos e externos ao estabelecimento de ensino. Os fatores externos emanam precisamente do fato de que nela coexistem indivíduos que são social (idade, sexo, raça/etnia, classe social, religião, interesses), política e de maneira econômicas díspares e estão relacionados, também, com o impacto dos meios de comunicação nas tradições que a atravessam bem como derivam do conjunto social particular em que cada escola se situa.
              Se o caminho se faz andando, passo a passo, caminho a caminho, acredito que, aos educadores, compete a empreitada mais importante de conhecer as expectativas, lutas, cosmologias, caminhos e especificidades culturais que diferenciam os alunos e, levando em consideração o bom senso presente no senso comum, instituir diálogos pedagógicos mais interculturais, mais reflexivos e menos preconceituosos. Educar para a diversidade é isso! Não é possível resolver os problemas sociais e econômicos na escola, mas é admissível problematizar e formar criticamente para a valorização e o reconhecimento dos diferentes e desiguais, essencialmente nas suas declarações de luta, oposição e de protagonismo por outro mundo possível (não capitalista) e inteiramente indispensável. (CAPELO, 2008).




REFERÊNCIAS

CAPELO, M. R. C. Quando a diversidade cultural se transforma em desigualdade social: primeiras aproximações. Mimeo. Londrina, 2008.

COLL, A. N. Propostas para uma diversidade cultural intercultural na Era da globalização. São Paulo: Instituto Polis, 2006 (Cadernos de Proposições para o Século XXI).

GALTUNG, J. Transcender e transformar. Uma introdução ao trabalho de conflitos. Tradução Antonio Carlos da Silva Rosa. São Paulo: Palas Athena, 2006.

SANTOS, M. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, 1987.

SILVEIRA, R. M. G. Diversidade de Gênero – Mulheres. Direitos Humanos: capacitação de educadores. João Pessoa: Editora Universitária / UFPB, 2008, v. II.

TAYLOR, C. Grandeza e miséria da modernidade. Éditions plano, 1992.








[1] Sob o ponto de vista das ações e instrumentos produzidos nos humanos, temos a criação do Tribunal de Nuremberg (1945) para julgar os crimes praticados pelos países europeus do Eixo; a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948): a Convenção contra o Genocídio (1948), e outros instru­mentos. Podemos observar que ha um primeiro momento de gestação desses instrumentos e um relativo hiato (de dezoito anos) na produção de textos de maior peso, quebrado apenas pela Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados (1951), até a adoção do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o dos Direitos Econômicos e Sociais (ambos de 1966).
[2] É uma iniciativa do governo federal com objetivo de prevenir e enfrentar todas as formas de violência contra as mulheres. O Pacto Nacional consiste no desenvolvimento de um conjunto de ações a serem executadas nos próximos quatro anos, de 2008 a 2011. Disponível em: http://www.campanhapontofinal.com.br/download/informativo_02.pdf

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